Catarina e a Prenda Mágica

Da janela do quarto, todas as manhãs a Catarina ia vendo os amigos lá fora, a correrem, para a carrinha da escola, lançando-lhe beijos que com o frio se transformavam em pequenos flocos de neve brilhante. Ela retribuía com um sorriso quente, mas de lágrima a espreitar, triste por mais uma vez, não os poder acompanhar. Um mês tinham dito os médicos aos pais. Pelo menos um mês sem sair de casa, nem por meia hora, nem para brincar no jardim. A doença tinha sido séria, e agora era preciso ter muito cuidado com as correntes de ar e as mudanças de temperatura. E para já, também não era bom que os amigos lá fossem a casa brincar. Tinham-lhe dito que era por causa duns tais de germes.
- Germes?! – Tinha repetido com a cara feia de quem, não percebendo do que se trata, não tinha gostado do nome.
Nos primeiros dias não tinha sido muito mau. Como ainda estava fraca, os pais estavam sempre com ela no quarto, a mimá-la e a brincar, mas agora, que já se encontrava melhor, a rotina tinha voltado à casa. O pai saía todos os dias cedo para tratar da quinta, e a mãe tratava da casa e do negócio das compotas, enquanto a Catarina, já cansada de brincar sozinha, passava os dias saltitando entre a cozinha onde ajudava a mãe a descascar a fruta e a janela onde, lá longe, ia vendo o pai a trabalhar num tractor.
Naquela manhã, com o coração ainda mais apertado de saudade do que era costume, correu a abraçar a mãe, perguntando entre soluços:
- Quantos dias faltam mãe? Poucos ou muitos?
Ainda antes que a mãe lhe pudesse responder tocaram à porta.
Quando a porta se abriu e a Catarina viu a avó Lucília, não conseguiu conter a alegria.
- É a avó, é a avó! – gritava aos pulos, à volta da velha senhora, que com dificuldade e entre risos, lá ia tentando equilibrar, nos braços, uma enorme caixa branca donde caiam, quase rente ao chão, as pontas, dum também enorme laço vermelho.
- Calma Catarina – dizia-lhe, também a rir a mãe, enquanto ajudava a avó com a mala e com a caixa, receosa de que a alegria espalhafatosa da pequena fizesse cair a pobre senhora.A Catarina adorava a avó Lucília. A avó que cheirava a bolos acabados de sair do forno e a histórias de princesas e duendes mágicos. A avó que a aconchegava na cama e começava todas as histórias com a mesma frase de sempre: Num futuro não muito distante… - como se os dragões e os reis fossem coisa normal da vida, e estivessem ali mesmo na esquina da imaginação, prontinhos a saltar para a frente dos nossos olhos.
Só findas as saudades que sentiam e, quando cansadas de tanto rodopio, se deixaram cair no sofá, é que a Catarina voltou a notar a enorme caixa branca com um, também enorme, laço vermelho.
- Aquela prenda é para mim, avó? – Perguntou com os olhos a brilhar a Catarina, que adorava receber prendas.
- Sim, respondeu a avó, mas aquela não é uma prenda qualquer – continuou a avó em jeito de segredo - Aquela é uma prenda mágica.
A Catarina nunca tinha visto uma prenda mágica, mas o que estava ali, à sua frente no chão da sala, parecia-lhe uma prenda normal.
- Então se é mágica faz o quê? – Perguntou, desconfiada, a Catarina à avó.
- Lá dentro está um tesouro muito especial.
- Um tesouro?!
Como a Catarina não parecia querer acreditar, e acreditar é coisa muito importante quando se trata de coisas mágicas, a avó decidiu que o melhor era abrirem a prenda.
A Catarina nem precisou de que a avó acabasse a frase, e num instante já tinha desfeito o enorme laço vermelho e tirado a tampa da caixa, deixando a descoberto entre folhas de papel de seda de muitas cores, umas galochas prateadas muito, muito brilhantes, decoradas, junto à sola, com pequenos corações cor-de-rosa.
- Mas… são só umas botas de borracha - disse a Catarina um pouco desanimada.
- Catarina, lembra-te que tens de acreditar. – Relembrou-lhe a avó – E bem, estas não são só umas botas. São umas Galochas Prateadas. Um verdadeiro tesouro no mundo encantado das fadas. Sim - continuou a avó perante o ar espantado da Catarina - e só existem 3 pares em todo o mundo.
- Só três? – perguntou a menina.
- E ao que sei, este é o único que existe fora do mundo das fadas. Foram dadas ao avô Sebastião por uma fada apaixonada por um gigante muito tímido, a quem ele, em tempos, salvou duma situação perigosa.
A Catarina já tinha ouvido muitas histórias sobre as viagens mágicas do avô Sebastião, mas não sabia que ele tinha conhecido fadas e gigantes.
- E que magia é que elas fazem avó?
- A maior magia de todas, respondeu-lhe a avó a sorrir - Fazem a magia da alegria. Quando por exemplo, uma menina, como tu, está doente e triste por não poder brincar com os seus amigos, calça as Galochas Prateadas, e nesse preciso momento, dá-se uma magia e um enorme sorriso nasce-lhe no rosto, deixando-a bem-disposta para o resto do dia.
Entusiasmada com a ideia, a Catarina não quis esperar nem mais um segundo. Descalçou os ténis e, com a ajuda da avó, calçou as Galochas prateadas, que por mero acaso pareciam mesmo feitas para a medida do seu pé.
- Olha avó, acho que também me está a nascer um sorriso – disse a Catarina bem-disposta.
-Pois é – concordou a avó – E agora já sabes, sempre que te sentires triste basta calçares as Galochas Prateadas e em menos de nada vais ter um sorriso na cara.
Estavam tão entretidas na conversa sobre as Galochas Prateadas que nem deram pela chegada da mãe que as vinha chamar para o almoço.
A caminho da mesa, a Catarina puxou a manga à avó, e perguntou-lhe baixinho:
- E feitiços avó, as Galochas Prateadas também fazem?
- Acho que não minha querida, respondeu-lhe a avó no mesmo tom, porquê?
- Se fizessem podia mudar o almoço, é que eu não gosto mesmo nada de bacalhau com grão.
A avó e a menina não puderam evitar uma gargalhada.

Desta vez não fomos as vencedoras, mas demos mais uns passos em frente na experimentação do Conto Infantil. Cá por casa a história fez um enorme sucesso e quase todos os dias se fala da menina que ganhava sorrisos ao calçar as "calochas", e essa é, sem dúvida, a maior vitória.

6 comentários:

Marta disse...

Continuo a achar que devia vir contar uma dessas histórias à nossa sala. Adorei, qualquer uma delas!!! Não é de admirar que façam sucesso aí por casa!

Beijinhos

M. disse...

Nos próximos tempos, infelizmente não vai ser possível. Mas logo que possa fica prometido.

susyr disse...

Eu gosto particularmente da mensagem que os contos passam!
Gostei muito...

PS- Eu ainda não consegui parar para ter inspiração mea culpa!!!

Mãe João disse...

story break morning!!!!!!!!!!!!!!

Van disse...

O sucesso em casa é o melhor prémio :)

MóniKa disse...

Gostei muito.
Continuem.
Beijinhos
Mónica