Californianas

Eu não sou muito de seguir as trends de moda. Lá vou acompanhando e, quando a guita permite, comprando uma ou outra coisita mais identificada com a estação mas sempre na percepção de que a peça ou acessório, terá de se adequar a mim mais do que eu ao alucinio de um qualquer designer de moda. Ao nível dos penteados contudo estou-me, genericamente, a borrificar para as trends, pelo que frequentemente deixo o cabelo crescer quando a moda institui o curto, dou ordem de soltura aos caracóis (naturais, ao contrário do que muitas invejosas julgam) quando o establishement proclama que liso é que é, e pinto do preto quando são os vermelhos a estar em alta. Juro que não faço de propósito, simplesmente estou-me a borrifar. Já há tanta coisa em mim que me incomoda, que decidi me dar ao luxo de, pelo menos nisto, não deixar ser a palavra de terceiros a ditar as regras. Não estou contudo alheada do que me rodeia, e observo com curiosidade a forma como as miudas absorvem os ditames de beleza do momento. E neste contexto a moda, mais ou menos, recente das californianas é coisa que me fascina. Não porque as ache particularmente bonitas, mas precisamente porque acho inexplicável que alguem, deliberadamente, lixe uma das partes mais sensíveis do cabelo, procurando obstinadamente um look de surfista californiana, numa lisboa invernosa e em criaturas de tez pálida e com hábitos de vida claramente a anos luz da cool chick americana em busca da best wave. Mas se tudo isto era alvo de reservada reflexão (e quiça chacota) dentro do meu crânio, foi com surpresa que hoje me deparei com um artigo sobre as Californianas na revista de um dos pasquins semanais que se distribuem gratuitamente lá pelo sitio onde trabalho, e onde a autora, também ela o retrato da típica hipster blasé, procura fazer a ligação socio cultural do recurso das californianas à "busca do lifesttyle ideal do nosso tempo: a mulher quer-se moderna, urbana, activa e despreocupada em todas as ocasiões" remetando com a sapiência que a escrita de artigos desta natureza certamente lhe confere, que "o uso generalizado de californianas é muito mais do que o seguimento voluntário de uma tendência: é o desejo do estilo de vida de um arquétipo." No meio disto tudo, o que estranhei no discurso elevado, aliás como o tema em si também o justifica, foi o da autora nunca ter considerado que o ideal da mulher moderna pudesse passar menos pelo estupidificado ato de queimar as pontas espigadas e mais pelo desenvolvimento dos neurónios que lhe habitam o espaço cerebral, e pelo desenvolvimento do espírito crítico que cada vez mais se vê sumido em preocupações vãs de penteados desapropriados e tendências de moda que ditam a personalidade ao invès de simplesmente a enfatizar. Mas enfim, talvez tenha sido apenas a confirmação de que há revistas que servem para serem lidas na casa de banho, enquanto se faz precisamente o mesmo que lá se lê.

Sem comentários: